Os moradores do prédio começam a sair de seus apartamentos por volta das sete ou sete e meia. Com o seu habitual sorriso, deseja bom dia a todos que passam em seus luxuosos carros, mas somente os que estão com os vidros abaixados podem ouvir, e ainda sim, não respondem. Ele não se importa, pois sabe que está fazendo a sua parte e, no dia que parar de desejar bom dia, será chamado à atenção pelo síndico.
Os outros companheiros de trabalho o acham um tolo, por continuar a desejar bom dia para pessoas que nunca respondem, mas ele insiste dizendo que está fazendo a sua parte.
Carro após carro vai passando pela portaria.
- Bom dia, Dr. Orlando! – diz e acena discretamente.
O Dr. Orlando continua olhando para frente, não responde e mantém as mãos fixas no volante.
“Ele é um advogado muito ocupado, não tem tempo pra prestar atenção em outras coisas. Talvez, não respondeu por isso.” Pensa.
- Bom dia, dona Carla!
A dona Carla não responde e nem olha para ele. Grita com seus filhos que estão fazendo bagunça dentro do carro, e segue em frente.
“Essas crianças não deixam ninguém conversar.” Justifica para si.
- Bom dia, Roberta!
Mas a empregada do 1982 passa pela porta e não lhe dá a menor atenção. E ele fica tentando descobrir o que é que deixa as pessoas assim, pois quase todos os funcionários tendem a agir como seus patrões.
- Tenha um bom dia, dona Silvia! – fala alto e acena, pois dona Silvia está com os vidros fechados.
- Deixa de ser besta, homem! Esse povo nem repara em você. É como se você fosse invisível. – adverte o jardineiro que o observava desejar bom dia a todos que passaram por lá.
- Não. Nada melhor que desejar “bom dia!”. Eles podem até não saber, mas isso realmente melhora o dia deles.
- Sei. Pois, boa sorte, Homem Invisível! – debocha o jardineiro.
E todos os dias em seu trabalho são iguais, deseja os seus “bom dia!” e mesmo sem obter resposta, mantém o sorriso no rosto.
“Ótimo dia trabalho pro senhor, seu Carlos!”; “Boa aula, professor!”; “Até mais e um bom dia, seu Pedro!”; “Boa aula, crianças!”; “Bom dia, Dra. Rita!”; e todos passam sem responder, acenar ou sequer olhar para ele.
Dia após dia a mesma coisa, e os outros funcionários do prédio chamando-o de Homem Invisível, porém, nada disso o incomodava.
Um dia, terminara o seu horário de trabalho e ele se preparava para ir embora, quando, passando pela portaria, cruzou com uma moradora e sua filhinha, desejou-lhes boa noite e seguiu.
- Boa noite, João! – respondeu a menina, sorrindo e acenando para ele.
João parou, olhou mais um pouco para aquela criança e foi embora para casa mais feliz que o habitual. E as pessoas que o viam na rua, ficavam curiosas por ver que aquele homem sorria sem um motivo aparente. E ao perceber que todos olhavam para ele, João sorriu mais ainda e disse:
- Não, eu não sou invisível!